domingo, 12 de junho de 2011



 Na roça

Marcava a sola do pé na terra vermelha e macia do sitio Boi Mirim. 

Minha avó cantarolava uma moda enquanto misturava com colher de ferro as folhas de capim limão, hortelã e mentruz, num tambor cheio de álcool de cereais. 

Pernilongos pousavam na minha perna num movimento de estilingue, indo e voltando, enquanto eu estapeava a esmo o ar. 

Subi a escada do varandão e contornei a casa. 

Pulei no meio dos pés de alface e corri pelo vão entre as folhas crespas até o espantalho. 

Foi então que pisei no Teiú. 

Grande e gelado, ele serpenteou para o lado das chicórias. 

Puxei um bambu do espantalho e rocei a terra fofa. 

Estraguei metade das folhas que minha avó usava na salada e nada do lagarto. 

Ouvi um farfalhar no final das hortaliças e, aos pulos, cerquei o bicho. 

Então larguei o bambu e caminhei junto do Teiú até um pé de gabiroba.

O Teiú subiu em espiral pelo tronco e abocanhou um punhado de gabirobas. 

Deixou cair todas no chão e me disse:

- Essas são pra você e vê se me deixa em paz.

Na mesma tarde o Teiú foi esmagado por uma carroça.

Na cidade

Marcava a sola do pé no cimento fresco da calçada do prédio comercial Boi Mirim. 

Minha avó cantarolava uma moda enquanto misturava amêndoas e açúcar na panela do seu carrinho.

Pernilongos pousavam na minha perna num movimento de estilingue, indo e voltando, enquanto eu estapeava a esmo o ar. 

Entrei no hall do prédio e peguei o elevador.

Foi então que pisei no Teiú ascensorista.

Ele apertou o botão do último andar e subiu sem paradas.

Quando a porta abriu, ele disse:

- Tu tens gabiroba ou vou ter que lhe trazer?

Na mesma tarde o Teiú foi demitido.

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